Pular para o conteúdo principal

OS DILEMAS HUMANOS SEGUNDO ERICH FROMM - ENTREVISTA COM ANDRÉ DE MELO SANTOS

 

OS DILEMAS HUMANOS SEGUNDO ERICH FROMM

ENTREVISTA COM ANDRÉ DE MELO SANTOS

EDIÇÕES REDELP

 

 

André de Melo Santos é pesquisador, historiador e sociólogo. É graduado em História pela Universidade Federal de Goiás; Especialista em Ciência Política pela Universidade Estadual de Goiás; Mestre e Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás. Em seu doutorado, desenvolveu tese sobre a concepção de socialismo em Erich Fromm, bem como escreveu artigos sobre esse autor. Assim, suas áreas de interesse vão da historiografia, passando pela ciência política e sociologia, até a psicanálise. André de Melo Santos também é organizador da obra Erich Fromm e os Dilemas Humanos na Sociedade Moderna (Goiânia: Edições Redelp, 2020). Ele nos concedeu uma entrevista sobre esta obra e questões correlatas visando trazer esclarecimentos a respeito da questão da contribuição de Fromm para entender os dilemas humanos na sociedade moderna. 

 

Edições Redelp: Qual é a intenção ou objetivo do senhor ao lançar essa obra na atualidade?

 

André de Melo Santos: Fromm foi um autor muito importante na minha formação intelectual. Estudei numa época em que o marxismo era muito criticado na academia e, eu tinha alguma leitura do marxismo e o Fromm contribuiu para essa formação no campo do marxismo. Penso que muitos pontos abordados em sua obra podem contribuir para a crítica da sociedade contemporânea como para a crítica do capitalismo.

 

Edições Redelp: Erich Fromm é um autor, como consta na obra, popular, pois foi traduzido em diversos idiomas e, no Brasil, suas obras tiveram várias reedições. Ao que se pode atribuir essa popularidade de Erich Fromm?

 

André de Melo Santos: Eu diria que seus textos tem uma linguagem simples para coisas complexas, ele consegue falar de marxismo e psicanálise de uma forma bem didática. As obras conhecidas como trilogia, Medo à Liberdade, Análise do Homem e Psicanálise da Sociedade Contemporânea são obras que exploram temáticas complexas, mas que a escrita é clara o que facilita e, ao mesmo tempo prende o leitor.

 

Basicamente o homem na sociedade capitalista não consegue desenvolver as suas potencialidades humanas. Essa sociedade proporciona a produção de riquezas ao mesmo tempo que o homem fica empobrecido no seu eu interior.

 

Edições Redelp: Curiosamente, lendo o livro, ficamos sabendo que, apesar de popular, Fromm não possui o mesmo reconhecimento nos meios acadêmicos e científicos. Como se poderia explicar isso? Existe uma contradição entre popularidade e reconhecimento na esfera científica?

 

André de Melo Santos: A academia vive de modas, na minha época de graduação na UFG, Weber era o autor que era tido como o grande exponencial nas ciências humanas, logo um autor marxista não vai ter muito espaço. Fromm também é acusado de “sociologizar” a psicanálise o que gera uma crítica no campo da psicologia. Fromm participou da fundação da Escola de Frankfurt isso geralmente não é lembrado pelos estudiosos dessa escola. Na educação, preferem o Adorno e não custa lembrar que nos movimentos de 1968 ele chamou a polícia contra os estudantes, algo contraditório para quem combate o autoritarismo. Logo, embora na obra de Fromm existam problemas, no geral sua obra é relevante, mas na academia muitas vezes vale mais a moda do que a relevância.

 

"A obra de Fromm apresenta uma discussão interessante 
sobre a liberdade, que é o cerne do dilema do homem moderno". 


Edições Redelp: O livro trata dos dilemas humanos na sociedade moderna a partir da perspectiva de Erich Fromm. Quais são esses dilemas? Não seria exagerado colocar assim? Não é apenas um título pomposo para vender livros?

 

André de Melo Santos: Basicamente o homem na sociedade capitalista não consegue desenvolver as suas potencialidades humanas. Essa sociedade proporciona a produção de riquezas ao mesmo tempo que o homem fica empobrecido no seu eu interior. Ao diagnosticar isso Fromm busca os caminhos para a sanidade, embora tenha se esquecido do caminho principal que é a transformação social. O título ficou adequado a discussão que Fromm faz ao longo de sua obra e, seria bom que livros como esse fossem além dos meios acadêmicos e alcançassem o grande público.

 

A grande contribuição de Fromm e do freudo-marxismo foi juntar essas duas teorias [psicanálise e marxismo] o que enriqueceu a compreensão da sociedade capitalista, abriu espaço para uma crítica desses mecanismos de dominação.

 

 

Edições Redelp: Erich Fromm é um psicanalista. O que ele, um psicanalista, tem a dizer sobre a sociedade moderna? Ele diz algo que os sociólogos já não disseram? Ele não cai num reducionismo psicologista?

 

André de Melo Santos: A psicanálise tem uma grande contribuição ao desvendar os mecanismos da mente humana, o inconsciente desvendado pela psicanálise contribui para compreender como o homem vive dentro de contradições e como a sociedade exerce a sua dominação sobre o indivíduo. Marx, que não era sociólogo, foi um autor que buscou compreender os mecanismos de dominação utilizados pela sociedade capitalista. A grande contribuição de Fromm e do freudo-marxismo foi juntar essas duas teorias o que enriqueceu a compreensão da sociedade capitalista, abriu espaço para uma crítica desses mecanismos de dominação.

 

Edições Redelp: Um dos temas que aparecem no livro é o da alienação. O conceito de alienação já rendeu dezenas de livros de filósofos, sociólogos, marxistas, psicólogos, até religiosos. Como se insere a discussão de Fromm a esse respeito?

 

André de Melo Santos: Para Marx, a alienação se dá no trabalho, o homem não controla o processo produtivo, passa a ser um meio e nesse processo ele perde a sua essência. O termo alienação é muito utilizado, mas com significados diferentes do conceito de Marx. Fromm também fala de alienação em um sentido muito amplo que por um lado comete equívocos, mas por outro chama atenção para questões de distanciamento do homem da sua essência que acaba gerando conflitos tanto no homem quanto na sociedade.

 

Ao longo de sua obra Fromm se colocou como defensor daquilo que o subjetivismo critica. Além disso, o subjetivismo combate o marxismo um dos pilares do pensamento de Fromm. Logo, sua discussão sobre liberdade serve tanto para o contexto do nazismo como para o contexto atual do neoliberalismo.

 

 

Edições Redelp: Outro tema presente na obra é o da liberdade. O que Erich Fromm traz de novidade sobre este tema, um dos mais antigos e debatidos da humanidade, desde as discussões sobre o “livre arbítrio”, passando pela discussão sobre a liberdade individual dos liberais, a concepção racionalista de liberdade de escolha, a concepção marxista de libertação humana, até chegar ao subjetivismo contemporâneo?

 

André de Melo Santos: A obra de Fromm apresenta uma discussão interessante sobre a liberdade, que é o cerne do dilema do homem moderno. Ao mesmo tempo que conseguiu se livrar da prisão que era submetido na sociedade feudal, o homem não conseguiu desenvolver as suas potencialidades e se tornou refém das ideologias da sociedade capitalista. Ao longo da história surgiram ideologias que diziam defender a liberdade, em linhas gerais o paradigma subjetivista, que é hegemônico hoje, se caracteriza pela crítica da razão, recusa da totalidade e da historicidade. Ao longo de sua obra Fromm se colocou como defensor daquilo que o subjetivismo critica. Além disso, o subjetivismo combate o marxismo um dos pilares do pensamento de Fromm. Logo, sua discussão sobre liberdade serve tanto para o contexto do nazismo como para o contexto atual do neoliberalismo.

 

Apesar de um diagnóstico bem elaborado sobre a sociedade capitalista, Fromm oscilou em colocar a questão fundamental, que é a transformação social.

 

Edições Redelp: O que Fromm pode contribuir para compreendermos a sociedade contemporânea, que mudou muito após sua morte em 1980?

 

André de Melo Santos: Podemos dizer que, no momento em que Fromm morre, o capitalismo estava na passagem do regime de acumulação conjugado para o integral. Isso coloca o fim das esperanças de um Estado de bem-estar. Fromm em momentos de sua obra imaginava um modelo de capitalismo reformado, o que se provou historicamente impossível e, o regime de acumulação integral com o Estado neoliberal, organização toyotista do trabalho e o hiperimperialismo veio para destruir os poucos ganhos que os trabalhadores tiveram no regime anterior. É possível que se Fromm tivesse acompanhado esse processo por mais tempo poderia rever alguns pontos de sua obra. Apesar de um diagnóstico bem elaborado sobre a sociedade capitalista, Fromm oscilou em colocar a questão fundamental, que é a transformação social.

 

Para mais informações sobre o livro Erich Fromm e os Dilemas Humanos na Sociedade Moderna, Clique Aqui.

Para ver o booktrailer desse livro, clique aqui.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

FEMINISMO E IDEOLOGIA - ENTREVISTA COM JACIARA VEIGA

FEMINISMO E IDEOLOGIA ENTREVISTA COM JACIARA VEIGA EDIÇÕES REDELP     Jaciara Veiga é socióloga e pesquisadora do movimento feminino e feminismo. É graduada em Ciências Sociais e mestre em sociologia pela Universidade Federal de Goiás; Doutoranda em Sociologia pela UFPR – Universidade Federal do Paraná. Jaciara Veiga é autora do livro O Significado do Feminismo – Movimento Feminino e Ideologia (Goiânia: Edições Redelp, 2022). Ela nos concedeu uma entrevista sobre esta obra e questões correlatas visando trazer esclarecimentos a respeito da questão do movimento feminino e do feminismo, esclarecendo o significado do feminismo no desenvolvimento da luta das mulheres por sua libertação.   Edições Redelp: Qual foi o seu objetivo ao lançar essa obra na atualidade?   Jaciara Veiga: Eu já me interessava por questões relacionadas às mulheres e suas lutas, desde a graduação. Sempre que possível abordava a temática acerca das mulheres em minhas pesquisas. O curioso era perceber

ETNIA E MOVIMENTOS SOCIAIS EM MOÇAMBIQUE - ENTREVISTA COM ÓSCAR NAMUHOLOPA

  ETNIA E MOVIMENTOS SOCIAIS EM MOÇAMBIQUE ENTREVISTA COM ÓSCAR NAMUHOLOPA EDIÇÕES REDELP   Óscar Namuholopa é sociólogo e pesquisador dos movimentos sociais. É graduado em Ensino de História pela Universidade Pedagógica de Moçambique; Mestre e Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás. Ele também é autor do livro As Relações Étnicas em Moçambique e a Formação do Mociza (Goiânia: Edições Redelp, 2022), obra que é tema da entrevista abaixo. Namuholopa explica vários aspectos relacionados com sua obra, enriquecendo as informações a seu respeito e contextualizando a questão do Mociza e das Relações Étnicas em Moçambique.   Edições Redelp: Qual foi a sua intenção em tematizar e publicar uma obra sobre as relações étnicas em Moçambique e a formação do Mociza?   Óscar Namuholopa: Moçambique é um país pluriétnico, cuja convivência pacífica é aparente.   Grupos étnicos há que reivindicam o seu afastamento do

A CRÍTICA RADICAL DE MARX AO ESTADO, PARTIDOS E SINDICATOS ENTREVISTA COM MATHEUS ALMEIDA E RUBENS VINICIUS DA SILVA

  A CRÍTICA RADICAL DE MARX AO ESTADO, PARTIDOS E SINDICATOS   ENTREVISTA COM MATHEUS ALMEIDA E RUBENS VINICIUS DA SILVA   EDIÇÕES REDELP     Matheus Almeida é pesquisador, antropólogo e militante autogestionário; É Graduado em Antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Mestre em Antropologia pela Universidade de São Paulo (USP) e Doutorando em Antropologia pela USP. Escreveu vários artigos sobre antropologia, marxismo, questão do Estado e outros temas. Rubens Vinicius da Silva é pesquisador, sociólogo e Militante Autogestionário; é Graduado em Ciências Sociais pela FURB/SC; Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e Doutorando em Sociologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Escreveu vários artigos sobre Marxismo, partidos políticos e diversos outros temas.   Rubens Vinicius da Silva e Matheus Almeida são os organizadores da obra Marx: Estado, Partidos e